No início do mês, o Spotify deu mais um passo significativo na sua expansão global de audiolivros ao lançar o serviço em quatro novos mercados europeus: França, Bélgica, Países Baixos e Luxemburgo. Assinantes premium nesses países têm acesso a mais de 200 mil títulos, além da possibilidade de adquirir audiolivros no esquema à la carte. Com isso, o Spotify consolida sua posição como uma plataforma multifuncional, oferecendo música, podcasts e, cada vez mais, audiolivros. Mas a pergunta que não quer calar é: quando será a vez do Brasil?

Executivos do Spotify no anúncio da chegada dos audiolivros na França, Bélgica, Países Baixos e Luxemburgo | © Sienna Lorraine Gray / divulgação
Para responder essa pergunta, primeiro, precisamos entender a quantas anda o mercado brasileiro e quais desafios precisa enfrentar. De acordo com o Audiobook Global Growth Report 2024, o mercado de audiolivros no Brasil é relativamente pequeno, com um faturamento anual de aproximadamente 30 milhões de euros e menos de 500 novos títulos lançados por ano.
Os audiolivros e o efeito Tostines
O número reduzido de títulos, associado ao alto custo de produção, coloca as editoras em um dilema, que faz lembrar o comercial da Tostines: o catálogo é pequeno porque há poucos ouvintes de audiolivros ou há poucos ouvintes porque o catálogo é limitado? Esse impasse reflete o grande desafio do setor no Brasil.
Apesar desse cenário, há sinais promissores. Um deles é a recente aposta da Audible no mercado brasileiro com o lançamento de Audible Original, uma linha de produções locais. O catálogo inclui obras narradas por personalidades como Lázaro Ramos e Paola Carosella, além de audiosséries e conteúdos educacionais.
Desde sua chegada ao Brasil em 2023, a Audible aumentou seu catálogo de 4 mil para 6 mil títulos, demonstrando o potencial de crescimento no país. Esses investimentos são uma resposta clara à demanda crescente por conteúdo em áudio no país.
Outro indicativo do crescimento é o aumento de receita no segmento de audiolivros, conforme apontado pela plataforma Bookwire no relatório Audiobook Global Growth Report 2024. O setor cresceu 98,5% no segundo trimestre de 2024, após um aumento de 100% no trimestre anterior, em relação aos mesmos períodos de 2023. Esses dados revelam uma aceleração significativa no consumo de audiolivros, impulsionada principalmente pelas plataformas de assinatura, que dominam o mercado. O documento aponta que, no Brasil, 85% das receitas de audiolivros vêm de assinaturas, com plataformas como Audible, Storytel e Ubook liderando o movimento. Essa predominância do modelo de assinatura reflete a necessidade de tornar o formato mais acessível e popular entre os consumidores. No entanto, evidencia outro desafio: como tornar o formato viável do ponto de vista financeiro. O modelo all you can eat pode atender às necessidades do consumidor, mas inviabiliza pelo lado das editoras. Isso porque, os custos de produção de um audiolivro são altos, mesmo com as promessas de baratear com tecnologias de inteligência artificial.
A popularidade dos podcasts no Brasil: uma oportunidade para audiolivros
Se o mercado de audiolivros no Brasil ainda está em desenvolvimento, o consumo de podcasts já é uma realidade consolidada. O Brasil é o terceiro país que mais consome podcasts no mundo, com 52 milhões de ouvintes, segundo dados da Podnews. Além disso, o relatório DataReport 2023, divulgado pelo Spotify, revelou que 42,9% dos usuários de internet no Brasil, com idade entre 16 e 64 anos, escutam podcasts semanalmente. Esse dado é especialmente relevante para o mercado de audiolivros, pois indica que há uma grande parcela da população brasileira familiarizada com o consumo de conteúdo em áudio.
Essa popularidade dos podcasts aponta para uma oportunidade clara: o público que já tem o hábito de ouvir podcasts pode facilmente migrar para audiolivros. A experiência de ouvir histórias, entrevistas ou discussões em formato de áudio tem muitos pontos de convergência com os audiolivros, e o Brasil, com seus 52 milhões de ouvintes de podcasts, tem um público-alvo pronto para ser convertido em consumidores de audiolivros. O aumento de 28% no consumo de podcasts no Brasil em 2023, segundo o relatório do Spotify, reforça o potencial do formato de áudio no país, e as plataformas de audiolivros podem capitalizar esse interesse crescente por conteúdo em áudio.
O futuro dos audiolivros no Brasil
A expansão do Spotify na Europa e o investimento da Audible no Brasil são sinais de que o futuro do mercado de audiolivros no país é promissor. No entanto, para que o formato realmente decole, será necessário um esforço conjunto entre plataformas e editoras para investir em marketing, além de aumentar a oferta de títulos e investir em conteúdos que atraiam um público mais amplo. O Brasil já tem uma base sólida de ouvintes de áudio, especialmente com a popularidade dos podcasts, e isso pode ser uma porta de entrada para o crescimento dos audiolivros. O desafio agora é transformar essa familiaridade com o formato de áudio em uma nova base de consumidores de audiolivros.
A pergunta “quando será a vez do Brasil?” ainda não tem uma resposta definitiva, mas o caminho para o crescimento está sendo pavimentado. O mercado editorial brasileiro está em um momento de transição, e as próximas decisões tomadas por editoras e plataformas podem transformar o audiolivro de um nicho em um formato mainstream, aproveitando a predisposição do público brasileiro para consumir conteúdo em áudio.
Quem viver verá.