Na última semana, a cidade mineira de Poços de Caldas oficializou a sua candidatura para fazer parte da Rede de Cidades Criativas da Unesco. O foco está justamente no eixo Literatura. Cidades como Quebec, Gotemburgo, Praga, Beirute, Melbourne, Dublin, Angoulême, Edimburgo, Milão, Cracóvia, Manchester, Seattle e Óbidos – a única de língua portuguesa na Rede – já conquistaram este título. São cidades que, na avaliação da Unesco, têm a literatura como um dos motores para o desenvolvimento sustentável e regeneração urbana. Agora, Poços de Caldas quer fazer parte deste time.
A candidatura ressalta as fortes tradições literárias da cidade e o seu impacto na educação e na cultura mais ampla. A cidade se orgulha de ter um dos maiores números de bibliotecas per capita do país e um dos maiores índices de leitura de todo o território mineiro.
Por trás da candidatura, está – entre outras tantas pessoas – Gisele Corrêa Ferreira, idealizadora e curadora do Flipoços, festival que agita a cidade desde 2006. Ela é a entrevistada desta semana aqui no Happy Hour Nespe. Na conversa, ela fala sobre os objetivos por trás da candidatura; a importância do Flipoços neste processo e ainda sobre os próximos passos da candidatura.
Happy Hour Nespe – O que faz de Poços de Caldas uma “Cidade Criativa no Ramo da Literatura”?
Gisele Corrêa Ferreira – Nós possuímos uma história literária desde a fundação da cidade, em 1872. O escritor Pedro Sanches Lemos (1846-1915), célebre pelos seus textos de ficção científica na área termal, é de Poços de Caldas. Seus escritos nesta área são, até hoje, reconhecidos no mundo acadêmico todo, inclusive em países da Europa. Poços de Caldas é a terra de grandes nomes da literatura brasileira como Jurandir Ferreira, Hugo Pontes e Antonio Candido, ocupando uma posição de destaque no já consagrado cenário sul-mineiro.
O seu viés literário é atestado por ser o berço de literatos e estudiosos da Literatura, é o lar escolhido por inúmeros poetas e ficcionistas, além de ser eleita como sede de diversos eventos, equipamentos, entidades e movimentos literários, que vão muito além do âmbito regional e alcançam repercussão estadual, nacional, continental e internacional. Poços de Caldas, é a cidade com o maior número de Bibliotecas per capita e conta com mais de 220 autores e autoras na ativa e com mais de 420 livros publicados.

Pedro Sanches de Lemos, o primeiro médico de Poços de Caldas e escritor de ficção científica, foi homenageado com um busto ao lado do Pálace Hotel, um dos cartões postais da cidade | © João Batista Shimoto / Wikicommons
HH – O que a cidade ganha conquistando este título?
GCF – Além de grande visibilidade para o Brasil, o título reforça a vocação inata da cidade de Poços de Caldas para a Literatura. O campo criativo da literatura talvez seja o mais difícil dentre os segmentos da economia criativa que a Unesco determinou desde 2004 quando instituiu o programa das Cidades Criativas. Esta á a primeira vez que uma cidade brasileira se inscreve nesta área. O dossiê preparado por Poços de Caldas, contém informações riquíssimas sobre todos os ativos que compõe este seleto grupo de itens que são determinantes para uma candidatura deste porte. Temos muita confiança na vitória de Poços de Caldas. Temos todas as condições para sermos uma cidade criativa pela Literatura.
HH – Boa parte da candidatura é calcada no Flipoços. Historicamente, qual o impacto do festival nos índices de leitura do município?
GCF – Na verdade, o Flipoços veio para consolidar a tradição literária de Poços. Quando lançamos o projeto em 2006, parece que a cidade já estava aguardando por ele. De lá para cá, com a consolidação do Festival Literário, da Feira do Livro e políticas públicas assertivas realizadas pelo município, a tradição literária explodiu. Tudo isso fez com que Poços recebesse o título de cidade com o maior número de leitores em Minas Gerais e proporcionalmente no Brasil, em 2015. Outra conquista veio em 2018, com o Prêmio Retratos da Leitura no Brasil, na categoria Cadeia Produtiva do livro como exemplo de boas práticas de incentivo à leitura.
HH – Uma vez apresentada a candidatura, quais serão os próximos passos?
GCF – Agora devemos aguardar até por volta do dia 20 de junho, quando o Itamaraty e Unesco Brasil anunciam as duas cidades selecionadas no País. Pelo que apuramos extraoficialmente, a Unesco recebeu pelo menos a inscrição de 5 cidades brasileiras. Somente Poços de Caldas pela Literatura. Assim que o resultado desta etapa for divulgado, a Unesco entra em contato com o munícipio, o qual terá em torno de 10 dias para os ajustes finais da documentação e outras orientações, e daí sim, fazer a inscrição na Unesco Paris, até o dia 30 de junho. Nesta etapa internacional, todas as cidades selecionadas dos países participantes, passarão por uma seleção ainda mais criteriosa. E o resultado final das cidades vencedoras para compor a Rede Internacional das Cidades Criativas 2023, será anunciado em Paris dia 31 de outubro p.f.
Se Poços de Caldas entrar na Rede, ela será a primeira no Brasil pela Literatura e a segunda em Língua Portuguesa, ao lado de Óbidos, Portugal. Agora nos resta, torcer!
Confira abaixo a apresentação da candidatura de Poços de Caldas à Rede de Cidades Criativas da Unesco