Grande parte das editoras brasileiras podem ser consideradas “independentes”. Mas o que é ser independente? Raquel Menezes, professora da Pós-Graduação em Edição e Gestão Editorial do Nespe e ex-presidenta da Liga Brasileira dos Editores (Libre), responde. Ela é a entrevistada desta semana do Happy Hour Nespe.
Na conversa, a publisher da Oficina Raquel fala ainda sobre bibliodiversidade, a retomada dos eventos presenciais e sobre a importância de encontrar um nicho.
Happy Hour Nespe – Você foi presidenta da Liga Brasileira dos Editores (Libre), entidade que congrega editoras independentes do país. O que faz uma editora ser independente?
Raquel Menezes – O conceito de independência passa, invariavelmente, pelo capital da editora. Uma editora independente é aquela cujo capital não depende de outros negócios, como grupos de mídia, instituições financeiras ou grandes grupos editoriais. É claro que, na maioria das vezes, as publicações de editoras independentes têm um caráter mais progressista. No entanto, basicamente, está mais relacionado com o desafio da publicação, no sentido da seletividade e dos recursos humanos e financeiros.
HH – A Bibliodiversidade é uma das bandeiras da Libre, e consequentemente, das editoras independentes. Um dos fatores que prejudica a bibliodiversidade é a concentração e a gente tem visto um aumento da concentração no mercado nacional. Que consequências isso pode ter para a indústria editorial brasileira?
RM – As consequências são as que observamos, hoje, no mercado em geral. Vivemos em um país com mais editoras do que livrarias, uma pirâmide invertida, segundo o livreiro Edu Cunha, que hoje está na Bookinfo, e isso causa muita concentração porque as pequenas não têm uma máquina com lastro para investir em marketing e publicidade.
HH – A Oficina Raquel, editora que você comanda, tem procurado uma linha editorial clara, pautada pela diversidade (de gênero, de raça, de corpos). Pensando em editoras independentes, qual a importância de se firmar dentro de um nicho específico?
RM – O compromisso com os nichos e com um público específico não é algo só do nosso mercado. Observamos tal comportamento em outras indústrias. Embora estejamos mais consumidores do que nunca, somos, ao mesmo tempo, consumidores mais conscientes. Queremos nos sentir representados pelo que consumimos. Me parece que era uma experiência somente do mercado de luxo, mas agora é geral. Os indivíduos querem, crescente e determinadamente, se vincular somente no que acreditam, principalmente em um mundo maus imediatista, instagramável.
HH – Uma das aulas que você dá aqui no Nespe é sobre eventos. Como você tem visto essa retomada agora? E quais perspectivas você enxerga para esse segmento?
RM – Olha que curioso… passamos tanto tempo pensando na retomada de eventos: como seria, quando seria. Todo mundo querendo adivinhar qual seria o primeiro evento presencial… Agora, que estamos vivendo este momento de muitas crises, estamos mais cautelosos. Assim, vejo dois momentos: 1) uma retomada geral e todo mundo fazendo todo tipo de evento; 2) na sequência, uma avaliação do que é realmente necessário existir como evento presencial.
HH – Outro tema que você trata nas suas aulas é sobre as ferramentas para facilitar o dia-a-dia na editora. Você pode resumir como utiliza esses mecanismos?
RM –Há dois anos, vivemos, aqui na Oficina Raquel, um caminho de automatização. Quando eu falo isso, muitas vezes, as pessoas perguntam de onde tiro dinheiro para automatizar tudo (risos). Nesse momento, eu explico que quanto menor o negócio, portanto, com menos recursos humanos, mais precisamos investir em tempo para estudar ferramentas que auxiliem o processo e assim a equipe enxuta possa trabalhar com mais sinergia. É um trabalho árduo, confesso, porque tenho sempre de estar explicando os benefícios de gastar às vezes três minutos pra entender uma ferramenta, para, ali na frente, ter mais minutos para potencializar ideias.
HH – Que dicas você daria para quem está querendo abrir uma editora? Por onde começar?
RM – Eu diria pra não abrir… Mas, caso insista, estude, se prepare e fique atenta às contas. Uma editora é um negócio, não um sonho. É um negócio que pode ajudar a fazer transformações sociais, sim, mas um negócio como qualquer outro.